terça-feira, 2 de março de 2010

COMO OS JOGOS DE PODER CARACTERIZADOS PELAS INSTITUIÇÕES TOTAIS AGEM SOBRE OS INFAMES.
RESUMO:

O presente texto pretende analisar como ao longo de séculos vidas são desprezadas, subjetividades são construídas através de discursos para a manutenção dos jogos de poder, e como o estado que se diz na função de dizer a justiça age como o Deus da Vingança.


Infame- 1- que tem má fama 2- que pratica atos vis, desonrrosos; abjeto, desprezivel; torpe 3- proprio de quem é infame; indigno. (dicionário Aurélio de lingua portuguesa)

Em seu livro a vida dos homens infames Michel Focault analisa como o discurso e os jogos de poder interferem na vida das pessoas. São breves relatos de monstros criados por um discurso;

Mathurin Milan, posto no hospital de charreton no dia 31 de agosto de 1707: “... sua loucura sempre foi a de se esconder de sua família, de levar uma vida de usura no campo, de ter processos, de emprestar com usura e a fundo perdido, de vaguear seu próprio espírito por estradas desconhecidas e de se acreditar capaz das maiores ocupações.”(Michel Foucault, 1977 pag. 204)

Jean Antonie Touzard, posto no chateau de Bicêtre no dia 21 de abril de 1701: “Recoleto, apostata, sedicioso capaz dos maiores crimes, sodomista, ateu, se é que se pode sê-lo: um verdadeiro monstro de abominação que seria mais inconveniente sufocar que deixar livre.”(Michel Foucault, 1977 pag.204)

“... não é uma complicação de relatos que se lerá aqui: são armadilhas, armas, gritos , gestos, atitudes, astúcias, intrigas cujas palavras foram os instrumentos. Vidas reais foram “desempenhadas” nestas poucas frases: não quero dizer com isso que elas foram figuradas, mas que de fato, sua liberdade, sua infelicidade, com freqüência sua morte, em todo caso seu destino foram , ali, ao menos em parte, decididos. Esses discursos atravessam vidas; essas existências foram , ali, ao menos em partes decididos. Esses discursos realmente atravessam vidas; essas existências foram efetivamente riscadas e perdidas nessas palavras.”

Estes relatos citados por Foucaut datados de mais de três séculos parecem nos distantes, porém, ao analisarmos relatos de vidas que foram dizimadas ao se encontrarem com as instituições totais , veremos que esta é uma realidade bem próxima. O estado que constrói subjetividades através de seus aparatos para a manutenção do poder;


O que veremos são histórias de brasileiros que existiram e que se tornaram públicos e que tiveram suas vidas marcadas ao se encontrarem com as instituições totais;

Janaina , institucionalizada na Febem nos anos 80;

"Há crianças sem lugar no mundo. são crianças entregues a instituiçõrs e que não se desenvolverão nos padrões esperados: não são portedores de deficiência mas, também não tem um comportamento dito normal. Assim erajanaina negra, pobre e institucionalizada na FEbem dos anos de 1980.Ela se debatia no berço e se machucava, ficava com a mão espalmada, não falava e não se ralacionava com outras crianças. Hoje, duas decadas depois, onde está janaina?

Após passar por várias instituições que foram fechando e acumulando perdas , Janaina vive hoje em um manicômio. carrega pelo corpo as marcas da institucionalização; não se comunica, faz uso contínuo de medicamentos, tem marcas e cicatrizes por todo o corpo.

SANDRO BARBOSA DO NASCIMENTO

No dia 12 de junho de2000, às quatorze horas e vinte minutos, o ônibus da linha 174 da empresa Amigos Unidos ficou detido no bairro do Jardim Botânico por quase 5 horas, sob a mira de um revólver, por sandro Barbosa nascimento, vítima da antiga chacina da candelária.

O seqüestrador era Sandro do Nascimento. Aos 6 anos, ele presenciou a mãe grávida ser morta a facadas. Depois disso, fugiu da casa da tia e se tornou um menino de rua. Foi um sobrevivente da chacina da Candelária. Viciou-se em drogas, e participou de assaltos para comprar tóxicos. Chegou a ser internado em instituições para menores, como a Febem. Saindo de lá, foi adotado por uma mulher na favela Nova Holanda. Já maior de idade, chegou a ser preso, mas fugiu. Aos 21 anos, após seqüestrar o ônibus que realizava a linha 174, foi capturado pela polícia e morto por asfixia, já imobilizado, dentro do camburão.

Após alegações de que a morte de Sandro foi ocasional, os policiais responsáveis pela morte de Sandro foram levados a julgamento por assassinato e foram declarados inocentes. Uma investigação concluiu que Geisa levou quatro tiros: um da polícia e três de Sandro.

São “vidas”, que ao entrarem em choque com o estado foram dizimadas. Quantas Janaína(s) viveram morreram nos manicômios sem que lhe fosse dada a oportunidade de tratamento, de recuperação? Será que essas vidas são menos importantes que as nossas, de que o estado objetiva proteção? Será que é justiça ou vingança o tratamento dado às pessoas que cumprem medida de segurança em manicômios judiciais e que ficarão presas perpetuamente por não lhe ser dada a chance de recuperação? É quanto ao Sandro ou Sandro(s) que nasceram nos guetos, que viram suas famílias serem mortas, ou que nunca as conheceram, é justo que morram todos os dias nas prisões? O estado tem a função de dizer quem é um monstro, quem tem que morrer, como nos casos relatados por Focault, onde o rei decidia quem deveria viver ou morrer?

Certamente não são poucos os discursos que querem legitimar a pena de morte, a prisão perpétua, que acham que é função do estado dizer quem deve morrer ou dizer. Essa legitimação se exterioriza na população diante de casos com grande repercução. São esses discursos criados pelos jogos de poder e externados pela população que legitimam o estado a “usar da vingança como pele de justiça”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário