terça-feira, 18 de maio de 2010

A questão dos Direitos Humanos no sistema carcerário brasileiro

Se pegarmos como ponto de partida o sistema penitenciário da Republica federativa do Brasil, podemos perceber que inúmeras irregularidades são cometidas para com a pessoa do condenado. Se partirmos de início com a própria Constituição Federal, carta da qual deveria ser respeitada sem questionamentos, já podemos perceber que o artigo 6º é violado ao falar que todos têm direito a saúde. No tocante aos tratados de Direitos Humanos assinado pelo país do qual tem caráter infraconstitucional, a situação se mantêm a mesma, com um sistema carcerário superlotado, incapaz de dar oportunidade ao condenado de se recuperar e principalmente de se reintegrar a sociedade, se sentindo parte dela.

Para entendermos um pouco sobre esse sistema prisional punitivo devemos recorrer a um dos grandes pensadores do direito no ramo penal. Günter Jacobs em uma de suas obras, afirma que para muitos o direito penal trata com uma visão meramente punitiva daqueles que seriam os inimigos da sociedade. Para ele enquanto a sociedade e o estado não encararem os condenados como pessoas humanas, membros da sociedade, a situação com relação a atual realidade nos presídios, penitenciarias, se manterá a mesma.

O Conselho Nacional de Justiça vem a um bom tempo tentando lutar contra a corrente da qual acredita que quanto mais colocarmos infratores atrás das grades, mais seguro o país se tornara. Alguns juízes inclusive já adotaram medidas um tanto quanto drásticas com relação a estes assuntos, uma vez que alguns já liberaram presos uma vez que o presídio não apresentava ao menos a capacidade de manter o preso com um bom estado de saúde. Esses atos geram na sociedade uma grande repercussão. Para muitos leigos no assunto os juízes responsáveis por esses atos são conotados como profissionais irresponsáveis e muitas vezes conotações piores. Vale à pena ressaltar que esses atos remetidos pelos juízes apenas foram fundamentados pela constituição federal, uma vez que a saúde é primordial para qualquer pessoa. Também para muitos deles, estes estabelecimentos de reclusão quando não preparados, são apenas mais um local para formar ainda mais delinqüentes e não ressocializar.

Os tratados de Direitos Humanos vieram como uma falsa panacéia para os problemas dos países de terceiro mundo, uma vez que muitos acreditavam que o problema era a ausência de leis e não de recursos e de princípios do estado. Estes tratados tinham como intenção regular o sistema prisional, gerando um local de maior facilidade para a pessoa do condenado poder se recuperar e se inserir no meio social. Essa onda de Direitos Humanos espalhada pelo mundo aplicava mais uma vez apenas algo ideológico longe de ser aplicado nos países menos desenvolvidos.

Portanto, podemos concluir que para melhor cuidarmos dos infratores precisamos primeiro mudar o pensamento de toda a sociedade, e somente após fazer isso poderemos pensar em começar a investir em políticas criminais eficazes das quais respeitem os direitos de cada condenado. Não podemos tratar o condenado como um inimigo e sim como parte da sociedade da qual precisa ser amparada.


TEXTO PRODUZIDO POR RAFAEL LAMOUNIER

(IMPOSSIBILITADO DE POSTAR EM SEU NOME POR PROBLEMAS TECNICOS)

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Justiça Universal?

Cazuza já escreveu, um dia, "Porque não há justiça no mundo/Não acredito em justiça/Porque não há justiça no mundo/Não acredito em justiça". Entre tantas atrocidades que presenciamos no mundo, não é difícil conceber que, ao menos uma vez na vida, não tenha passado na cabeça de alguém algo similar.
Entretanto, como representar a injustiça? O que significa? Seria possível universalizar uma concepção de forma que satisfaça a todos? Com séculos de material à disposição, este Blog mergulhou de cabeça nos vários aspectos da justiça e também da vingança. Poderia ser a vingança legitimada pelo próprio governo? A história nos diz que sim. E o que nos garante que no futuro isso pode mudar?
Dentro de uma sala, chegamos a vários aspectos e visões, mesmo entre pessoas de realidades tão semelhantes. "Assim, a justiça é injusta, porque o certo e o errado podem facilmente ser trocados em virtude do nosso próprio ego", "à luz dos ditames constitucionais, não há mais que se falar em vingança, mas sim em uma justiça alcançada e possibilitada a partir do devido processo legal" ou "a justiça é um valor universal, estando ao lado de outros valores tais como a liberdade, solidariedade, a dignidade, a democracia(…) a vingança se esgota facilmente e nunca é saciada plenamente". Talvez, ao pensar numa justiça ideal, seria possível esboçar algo mais abrangente, com ajuda de Filosofia ou do Direito, como "Aristóteles assevera que o homem justo é aquele que ao mesmo tempo cumpre a lei e realiza a igualdade. Portanto, uma legislação rigorosa não retrata uma vingança, mas o anseio da sociedade por soluções efetivamente justas", mas nunca será possível uma conclusão efetiva e universal enquanto cada um olhar para si para responder a esse impasse. Segundo Kant, só seria possível uma ação justa quando tal ação não viola a liberdade do outro, de forma que o direito se cria a partir de máximas, que são formadas a partir da coexistência dos atos de todos, de forma que a liberdade de ninguém é restringida.
Se nem mesmo entre pessoas com realidades, costumes e crenças similares é possível chegar a conceitos e visões análogos, quiçá entre diferentes ideologias, como muçulmanos, orientais, africanos. Logo, a justiça que é feita em algum lugar pode ser encarada como um ato de vingança, machismo, ou até mesmo animalismo. Kant, entretanto, pode ter iniciado algo a ser seguido, de forma que só seria possível alcançar uma justiça universal quando houver uma coexistência entre povos. No nosso patamar atual, há muito a evoluir, mas, enquanto estivermos fazendo a nossa parte, justiça estará sendo feita e a vingança, esquecida.


* Alguns trechos aqui citados foram retirados das postagens de outros colaboradores do Blog.

domingo, 16 de maio de 2010

Os programas jornalístico-policiais de televisão buscam efetivamente a realização da justiça ou simplesmente a vingança?

A televisão, nos dias atuais, juntamente com a internet, é um dos veículos que tem maior alcance e veiculação de informações em meio à sociedade e que também mais influenciam a opinião pública em relação a vários temas.

Hoje em dia não existe pessoa que desconheça ou que nunca tenha ouvido falar nos “famosos” programas jornalístico-policiais de televisão que retratam o dia a dia das forças de investigação de nosso país.

São telejornais com muitas entradas ao vivo durante sua exibição, principalmente de repórteres e de entrevistas, fazendo cobertura, em tempo real, de tragédias e desastres, que são o foco principal deste tipo de atração. É um formato de programação que tem sucesso em nosso país.

Muitos já foram criados até hoje e, além disso, transmitidos por várias emissoras diferentes de televisão aberta, como exemplo temos o Cidade Alerta, exibido pela Record, o Repórter Cidadão da RedeTV!, também temos o Brasil Urgente e o Minas Urgente ambos exibidos pela Bandeirantes, entre outros.

O que passa a ser interessante, nesse caso, é o fato de eles não buscarem esclarecer ou instruir a população sobre os procedimentos legais a serem respeitados com relação ao criminoso. Não, eles nem pensam nisso.

O foco não é a conscientização do corpo social, mas o que eles realmente querem é aumentar a sua audiência, através de apresentadores que usam uma carga emocional muito elevada em suas falas, levando o telespectador à revolta com relação ao caso que está sendo mostrado.

Aqui seguem alguns exemplos de frases enviadas por telespectadores que ficam influenciados por esse tipo de programa: “Datena, estes crápulas merecem morrer”, ou “o Brasil não pode ter pessoas assim, morte para eles”, e por aí vai. Isso incentiva o conjunto social a fazer justiça com as próprias mãos.

A minha opinião é a de que esse tipo de programa não ajuda e nem acrescenta em nada na formação de uma sociedade (sociedade que busca a justiça). Está lá apenas para conquistar a simpatia e a audiência da população, principalmente a mais carente, que sofre muita influência (negativa) com as colocações feitas por seus produtores.


TEXTO PRODUZIDO POR GUSTAVO REZENDE

(IMPOSSIBILITADO DE POSTAR EM SEU NOME POR PROBLEMAS TÉCNICOS)

E você, quer justiça ou vingança?

A vingança era a força que sustentava o sistema de justiça em um passado distante. Um passado tenebroso, época de olho por olho e dente por dente, em que a justiça e o direito se traduziam numa resposta imediata e enérgica contra o contraventor, fruto de um Estado omisso e ausente.

juri nardoni

O sentimento de vingança, revolta e vontade de degradar o criminoso nunca representou o real interesse da sociedade. Representa, em verdade, os interesses das vítimas e dos prejudicados com o crime, inundados com sentimento de perda, raiva, ódio e rancor.

Por este motivo, é impossível conceber a vingança como motivadora do sistema de justiça e fundamento da pena de um criminoso. Na teoria, a punição não tem mais valor de castigo/vingança, mas visa dar segurança ao Estado e reeducar o criminoso para retornar à sociedade de forma produtiva.

Entretanto, a idéia de vingança vigora forte na nossa sociedade. A pena é vista como uma forma de compensar o mal do crime, funcionando basicamente como um castigo. É o que se percebe nos veementes pedidos por justiça, logo após um crime, que na verdade, constituem pedidos veementes de vingança.

Imaginemos a existência de uma pílula que tornasse um criminoso socialmente aceitável, seguro e produtivo para o Estado, cujo efeito fosse imediato. Ou seja, não haveria mais necessidade de prisão, pena ou qualquer outra punição ao criminoso. O crime seria tratado como uma patologia.

Será que os prejudicados com o crime iriam ficar mais satisfeitos com esse tratamento milagroso ou com o cumprimento de 30 anos de prisão pelo criminoso? A vingança é a resposta que conduz a prisão por 30 anos do criminoso e creio ser a resposta da maioria da população que deve pensar: “O criminoso não sofrer é uma injustiça”

E você, quer justiça ou vingança?


TEXTO PRODUZIDO POR MATHEUS ANDRADE VIEIRA

(IMPOSSIBILITADO DE POSTAR EM SEU NOME POR PROBLEMAS TÉCNICOS)

O limite entre a justiça e a vingança: a (in)tolerância

Aos dizeres de Voltaire em sua obra escrita em Dezembro de 1763, “Tratado sobre a intolerância”, as inconsistências do procedimento judicial, na época, eram convalidadas pela mentalidade religiosa que cegava as pessoas. Voltaire foi reconhecido como defensor da razão e da liberdade de culto, contrário ao fanatismo e as superstições típicos do consciente e das leis francesas da época, isso porque propôs em seu texto a laicização do direito.
Mas o que torna interessante discutir aqui não é o julgamento, tolerante ou não, mas sim a tolerância como valor subjetivo e quais as suas conseqüências na sociedade. Primariamente faz-se necessário que desvinculemos qualquer ligação entre justiça-tolerância e vingança-intolerância visto que a tolerância, ou sua falta, caracteriza uma zona limítrofe entre a vingança e a justiça. É certo que a maioria das situações prevê que na presença da intolerância tem-se a vingança, mas desmitifiquemos tal pensamento: ao se praticar ações que são intoleráveis pela sociedade a processo judicial devido não se mostra tolerante à conduta, mas seu contrário, afinal, por ser intolerável tal conduta pune-se o agente. E pode-se afirmar o oposto também: uma ação é vingativa quando tenta reparar um dano com outro dano, há tolerância visto que o processo judicial busca justamente cancelar este ciclo contínuo de dano e reparação danosa, portanto tolera-se a segunda ação mas incorre a responsabilização judicial, não vingativa, mas coercitiva.
Assim trato da (in)tolerância como o limite, seja no processo legiferante seja no jurisdicional, entre ações vingativas ou justas. Comecemos com: “a tolerância só vale, pois, em certos limites, que são os de sua própria salvaguarda e da preservação de suas condições de possibilidade".(Vladimir Jankélévich) quer dizer o filósofo que a tolerância extrema acaba por destruir-se, como melhor explica Karl Popper "Se formos de uma tolerância absoluta, mesmo para com os intolerantes, e se não defendermos a sociedade tolerante contra seus assaltos, os tolerantes serão aniquilados, e com eles a tolerância". E para defender o oposto clama-se que uma sociedade totalmente intolerante acabaria por destruir-se, visto que valores são pessoais, caberia a um único governante editar normas dotadas do imperativo categórico kantiano de forma tão absoluta que qualquer deslize cominaria nas mais bárbaras penas, assim, a sociedade acabaria se exterminando ou descaracterizando-se sociedade.
Então qual seria o limite exato da tolerância? E nesse questionamento busco concluir meu trabalho. Como já explicitado acima que os valores são pessoais, portanto mutáveis; como óbvio afirmar que as sociedades são também mutáveis e que seus valores basilares são fruto da sua historicidade é impossível, então, criar-se um limite para o tolerância. Este se coaduna com o contexto social e deve neste ponto indicar as ações que foram justas e as ações vingativas. É baseado neste ponto tolerante, mutável de acordo com a sociedade, que deve se pautar a cognição de justiça ou vingança. A tolerância é ponto fundamental para que se legitime todo um arcabouço normativo, que dê-lhe efetividade e que dele possa se fazer a justiça.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Wille Duarte Costa, in memoriam

Quanto à minha postagem anterior neste blog, decidi dar menos ênfase à tênue distinção histórico-dogmática entre justiça e vingança para, em vez disso, analisar tais conceitos dentro do extenso problema da criminalidade brasileira. Dito isto, nada me deixa mais feliz e orgulhoso do que encontrar um artigo sustentando grande parte dos meus argumentos expostos na minha primeira postagem, artigo cuja autoria é de Wille Duarte Costa, pessoa a qual admiro imensamente graças ao meu contato com o Direito Empresarial.
Segue abaixo o artigo: leiam, reflitem e comentem.

SOU ADVOGADO



Wille Duarte Costa
Membro do IAMG

Da Academia Mineira de Letras Jurídicas
Prof. da Faculdade de Direito Milton Campos

Sou advogado. Mais que isto: sou Professor Universitário de Direito;
fundador da Faculdade de Direito Milton Campos; Doutor em Direito Comercial
pela UFMG; membro da Academia Mineira de Letras Jurídicas; do Instituto
Brasileiro de Direito Econômico; do Instituto dos Advogados de Minas Gerais; do
Instituto de Direito Comercial Comparado e Biblioteca Tullio Ascarelli, da USP;
membro honorário da Academia de Ciências Contábeis do Estado do Rio de Janeiro
e portador de inúmeros outros títulos que muito me orgulham. Por isto, o que vou
dizer não se resume em qualquer heresia, pois parte de quem, como professor,
como profissional do Direito, como homem do povo e como pai de família tem
sentido o absurdo da criminalidade em nosso País. Não é preciso enumerar os
casos que a cada dia tomamos conhecimento.

Se há um culpado? É claro. Existem muitos e não um. Entre estes estão as
autoridades constituídas em primeiro lugar e, logo a seguir, os políticos.
Prometeram construir novos presídios, mais seguros e melhores; endurecer as leis;
aumentar a vigilância e o contingente policial; acabar com a fome e o desemprego.
Não precisa ser dito que tudo ficou em promessas. O que fazer agora, se foram
eleitos e não se preocupam com o sofrimento e as lamúrias do povo?

Sempre entendi que o crime não compensa nem mesmo para os advogados.
Destes, apenas os criminalistas buscam a defesa de criminosos por um dever de
ofício. Mas quero desde logo tirar qualquer responsabilidade deles, dos juízes, dos
policiais e da própria lei. Dos criminalistas, é verdade, porque não há como
estabelecer responsabilidade a quem, por dever de ofício, quer ver criminoso livre
da cadeia. Dos juízes não há responsabilidade porque, apesar do medo da maioria
deles e da insegurança de alguns, eles procuram atender aos termos da lei,
cumprindo suas determinações, já que delas não podem fugir. Dos policiais
entendemos que a responsabilidade inexiste, porque eles obedecem às ordens das
autoridades constituídas. Da lei não há responsabilidade, porque é anedótico
apontar responsabilidade da norma jurídica, quando ela só surge da mente
daqueles que se encarregam de produzi-la e têm interesse no seu surgimento para
dela tirarem benefício político.

Quando surgiu esse absurdo chamado "Código da Infância e da Juventude"
proibindo a prisão do menor infrator, foi fácil prever que o pior estava por vir. Em
pouco tempo estávamos diante do menor cometendo assaltos de todas as formas.
Em breve (se é que já não estão fazendo) estarão batendo em nossas portas e
assaltando nossas residências, já que sabem que não podemos ter mais nossas








armas, por causa da bobagem de um governo que prefere desarmar as futuras
vítimas e deixar os criminosos armados.

Alguns criminalistas (ou todos eles) acreditam que a recuperação do
criminoso é certa. São poucos. Se não é assim, contem, se capazes, mais de dez
criminalistas vivos e famosos em Minas Gerais. De qualquer forma, sabem impor o
que lhes interessa. Pior que entre nós impera ainda o absurdo chamado Direitos
Humanos, impondo a todos um tratamento benéfico aos criminosos que não têm
por nós o menor apreço e acham ou têm certeza de que nada merecemos. Num
assalto, se resolverem nos matar, matam mesmo. Neste caso, nossa família que se
dane. Os direitos humanos são dirigidos para os criminosos. Se o falecido deixou
mulher e filhos, os que pregam os direitos humanos não levam às famílias uma
toalha, nem um cobertor e menos ainda qualquer palavra de consolo, de conforto,
de tranqüilidade, de esperança. Para eles não importa a família da vítima.

Embora sendo então advogado, espero que todos entendam como meu
amigo Doutor Agílio Monteiro: "o único direito que o criminoso tem é o de cumprir
a pena". Mais nada. As regalias hoje existentes deviam desaparecer, pois o resto é
bobagem desses malucos que pensam entender dessas coisas, por política
contrária ao direito da maioria enfraquecida.

OPINIÃES SOBRE O ARTIGO PUBLICADO (NO JORNAL "O TEMPO"):

1) Giselda Hironaka, da USP
Professora da USP - Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

"Caro Wille,
Eu li o artigo que me envia. Com um misto de emoção, preocupação e
intranqüilidade, preciso lhe dizer que concordo com cada palavra, em grau,
gênero e número.
Um abraço, corajoso amigo,
Giselda Hironaka
FDUSP" - 02/05/2005

2) Adriano Andrade e Silva
Professor da Faculdade de Administração Milton Campos
"Parabéns! O seu artigo expressa em palavras o sentimento que a cada dia nos
aflige mais!!
Abraços,
Adriano Andrade"
02/05/2005

3) Jack Corrêa
Vice-Presidente de Assuntos Governamentais






quinta-feira, 13 de maio de 2010

JUSTIÇA E VINGANÇA NA MITOLOGIA GREGA - A TRAGÉDIA MEDÉIA

A tragédia Medéia tem por princípio o agon, principal requisito da vida do ateniense que se manifesta nas assembléias e tribunais. Nesta dramaturgia, o agon envolvia questões relacionadas à escolha e a ação humana que provinha da ética e obrigava o espectador a fazer uma escolha: a justiça ou a vingança. O poeta nos apresenta a reação dramática de uma mulher, inconformada com o abandono do marido que não considerou todo um passado comum de aventuras. Medéia praticou vários crimes e transgressões em nome do amor que sentia por Jasão.
No prólogo tomamos ciência da trajetória de Medéia que veio da remota região de Colquida para o exílio em Corinto. Naquela região, considerada bárbara, ela conheceu Jasão e, movida por uma avassaladora paixão, traiu seu pai ao ajudar o herói Jasão a conquistar o Velocino de Ouro através da arte da magia e encantamentos. O ardil, usado por Medéia foi descoberto, obrigando-a a fugir em companhia de seu amado. Seu pai, o rei Aeetes, empreende uma perseguição ao casal pelos mares, porém, ao fugir, Medéia havia trazido o seu irmão Absyrto, que foi morto em meio à viagem. Ela o executou e esquartejou o seu corpo, jogando os pedaços ao mar para atrasar a perseguição de seu pai. A fuga teve êxito, porque o rei interrompeu a perseguição para recolher os pedaços do corpo do filho, vendo diante de seus olhos o crime de Medéia que pôs fim a sua descendência.
O poeta nos expõe uma mulher, cujo comportamento integra o espaço do desvio ao padrão estabelecido e esperado pelo homem grego. Ao evidenciar este crime, o poeta traz à memória dos atenienses o fato de que a protagonista havia estado envolvida em outros crimes de morte. No episódio ocorrido na região de Iolco, Medéia ardilosamente havia providenciado a morte o rei da pior maneira que um ser humano poderia morrer (Eurípides, Medéia, v. 485): através das mãos de suas próprias filhas. Estas foram persuadidas a acreditar que esquartejando o corpo de seu pai, o rei Pélias, em meio a ervas e encantamentos, conseguiriam a proeza de rejuvenescer o velho rei; o resultado foi a destruição de todo o palácio (Eurípides, Medéia, v. 485).
Por este crime, o casal foi perseguido pelo filho do rei morto. O atendimento ao pedido de asilo em Corinto foi aceito na condição de Medéia fazer uso de seus conhecimentos mágicos para cessar a seca, a fome e a infertilidade que assolava a região.
Nos interrogamos sobre o objetivo da mensagem do poeta ao nos expor uma mulher estrangeira, atuante, detentora de saberes mágicos e considerada mulher de feroz caráter, de hedionda natureza e espírito implacável (Eurípides, Medéia. v. 100). Medéia representa a mulher envolvida em circunstâncias hostis, saiu da casa de seus pais muito jovem para acompanhar o seu marido. Acreditamos que houve uma empatia entre o personagem Medéia e o público feminino, pois casar jovem era uma situação familiar com as quais as mulheres de Atenas, presentes no teatro, se identificavam. Ao assistir uma dramaturgia, o ouvinte se identificava emocionalmente com o drama vivenciado pela protagonista, a ponto de perder o julgamento racional em prol da satisfação e de interesses emotivos, gerando uma tensão entre a simpatia e o julgamento justo.
No momento em que a protagonista discursa para o coro que representa as mulheres de Corinto, ela expõe uma tradição na qual todas se reconheceriam, pois desde muito jovem eram destinadas à subordinação à autoridade masculina. O responsável pela família providenciava o seu casamento para o qual era preciso um dote com o objetivo de comprar um marido e cabia à jovem aceitá-lo como senhor com total controle sobre a sua pessoa.
O acordo de casamento acontecia entre os homens e as jovens não tinham a oportunidade de escolher o marido, o que levou Medéia a afirmar que de todos os que têm vida, a mulher, seria o ser mais infeliz pela obrigação de aceitar um homem a quem não podiam repudiar, visto que a mulher divorciada não era bem vista nesta sociedade (Eurípides, Medéia, v. 235). Quando chegavam na nova residência não sabiam o que as aguardava, por não terem sido bem instruídas pelos familiares, tinham por obrigação adivinhar qual a melhor maneira de convívio com o esposo. A jovem tendo a sorte de conseguir um bom esposo teria uma vida invejável, caso contrário, viveria sob o jugo da violência para a qual a morte tornar-se-ia o bem mais suave (Eurípides, Medéia, 235-240); em caso de gravidez, por exemplo, a protagonista afirmava preferir lutar com escudo três vezes a parir uma só vez (Eurípides, Medéia, v. 250).
O lamento de Medéia tornou-se público através do uso da palavra, da retórica que era um instrumento fundamental para a construção do drama visando expor o cotidiano da mulher ateniense. Diante da sua falta de opção e liberdade, as mulheres, por serem retiradas muito jovens da casa paterna e serem confinadas no interior do oikos, atuariam como mulher e esposa devendo, por obrigação, cuidar dos escravos, do marido, dos filhos e exercer com eficácia as atividades domésticas (Eurípides, Medéia v. 245).
O padrão definido como ideal para o comportamento feminino foi construído pelo homem grego que esperava que ela seguisse o modelo mélissa, a saber: ser submissa, silenciosa e passiva, atributos contrários ao comportamento masculino definido como dominante, ativo, agressivo e agente de decisão.
No entanto, o comportamento de Medéia trazia à memória dos atenienses o mito de Pandora, de quem, afirmaria Hesíodo, descender toda a funesta geração de mulheres (Hesíodo, Teogonia, v. 585) e que Eurípides complementava ao afirmar serem as mulheres habilíssimas artesãs de todo os males (Eurípides, Medéia, v. 409). Essas palavras marcavam o inconformismo da protagonista com a sua atual situação, Ela expressava o seu desagrado ameaçando os seus inimigos, a saber: três de meus inimigos matarei: o pai, a jovem e meu marido (Eurípides, Medéia v. 375), e, ao mesmo tempo, alertava que ninguém a considere fraca, sem força, sossegada diante do infortúnio, mas de outro modo perigosa contra os seus inimigos (Eurípides, Medéia v. 410). A partir destas palavras, a protagonista de Eurípides, decidiu pela ação de vingança, atitude reconhecida nos heróis trágicos em sua busca desesperada por recuperar a honra ultrajada como o guerreiro Ajax de Sófocles.
Ajax e Medéia apresentam atitudes semelhantes: não suportam a idéia de serem vítimas de injustiças e de traição. Ambos não toleram a etimasmene - falta de respeito (Eurípides, Medéia, v. 1355) de seus inimigos que riem de suas atuais condições de fracasso; no caso de Medéia, por estar só - mone (Eurípides, Medéia v. 513) e abandonada - eremos (Eurípides, Medéia v. 255). Medéia decidiu agir com violência por não querer causar riso deixando impunes os seus inimigos (Eurípides, Medéia v. 1050). A sacerdotisa de Hécate deixava transparecer que a mais grave atitude diante de uma vítima de desprezo e fracasso era o riso - gelos (Eurípides, Medéia v. 383), e somente a vingança cruel através da morte poderia reverter esta situação tornando-a vitoriosa diante dos inimigos (Eurípides, Medéia, v. 395).
A semelhança entre Ajax e Medéia não é mera coincidência, pois o poeta coloca na personagem atitudes masculinas, mesmo sendo inapropriado para uma mulher agir com inteligência e coragem. O uso da palavra e sua atitude decisiva remetem às ações de heróis que atuavam de forma individual para solucionar uma situação imediata, como nos indicam os termos como ergasteon (Eurípides, Medéia v. 791) definido como algo que deve ser feito; a palavra tolmeteon (Eurípides, Medéia v. 1051) nos remete a algo ousado a ser realizado. O verbo kteno significa a decisão de, em tempo breve, matar, extinguir, exterminar. Com reações próprias de seres passionais, Medéia exibia o seu temperamento movido por forte emoção - thymos, sentimento que marcava toda a trajetória da narrativa, considerada fora da razão, da justiça coletiva, da justa medida; uma ação identificada em povos que viviam fora da cultura. Jasão reforçava este pensamento ao reafirmar que a grande dádiva que ele, cidadão grego, havia ofertado à Medéia foi tê-la tirado de terras bárbaras trazendo-a para residir na cultura helênica que conhecia a justiça, a ordem e as leis (Eurípides, Medéia, v. 535).
Medéia muda de atitude visando atingir seu objetivo. Ela passa a agir de acordo com o modelo estabelecido pelos homens, ou seja, submissa, obediente, deixando transparecer que aceitava o destino determinado por Jasão e Creonte. Ela prometia acatar a ordem do rei que havia determinado a sua saída de Corinto (Eurípides, Medéia, v. 927). Para reafirmar o seu arrependimento e compromisso, Medéia envia, através de seus filhos, o presente de núpcias (envenenado) para a noiva de Jasão, e desta maneira ela mata a princesa e o rei.
O discurso dissimulado tem por princípio a arte da persuasão, da força da palavra que convence e permitindo a realização de sua vingança. Como mulher, ela não tinha a capacidade do uso da força física precisando, portanto, buscar meios alternativos para fazer valer a sua vontade e vencer o inimigo. A única solução foi usar o conhecimento do qual provinha sua habilidade e o saber que dominava: a arte da magia no uso de filtros e venenos, cujo conhecimento fazia parte de sua tradição familiar por ser sobrinha de Circe, sacerdotisa de Hécate e neta de Hélios.
Sua ascendência lhe forneceu força, coragem e magia, atributos essenciais para sacrificar e enterrar os filhos no santuário de Hera Akraia. De acordo com os mitógrafos anteriores ao final do V século, os filhos de Medéia teriam sido mortos pela população de Corinto para vingar a morte de seus soberanos. Entretanto, o poeta Eurípides estabeleceu uma nova vertente mítica mostrando que as crianças haveriam sido executadas como sacrifício aos deuses pela própria sacerdotisa de Hécate. Talvez uma forma cruel e eficaz de vingança contra o abandono do marido e uma maneira de expor o quanto ela era terrível com os seus inimigos, pois, matando os filhos ela extinguia a descendência de Jasão que reconhecia: sem filhos você me destruiu (Eurípides, Medéia, v. 1325).
O poeta coloca Medéia fugindo em direção à Atenas, lugar em que a sacerdotisa utilizaria os seus saberes mágicos a serviço do rei Egeu, ao afirmar: cessarei o teu ser sem filhos e te farei semear filhos, tais drogas conheço (Eurípides, Medéia, v. 715). Esta informação nos remete à proposta de Eurípides de usar o palco trágico como o espaço das denúncias relativas às transformações, que aconteciam na sociedade ateniense no final do V século.
Analisando a personagem Medéia, algumas questões nos chamam a atenção: a protagonista não representa a mulher grega devido a sua atitude considerada bárbara, como nos informa as palavras de Jasão ao afirmar que nenhuma mulher grega ousaria matar os próprios filhos (Eurípides, Medéia, v. 1340). Então que tipo de mulher ela representaria?
Medéia usa a palavra para convencer, apela para a morte visando remover obstáculos, usa da astúcia, da faca e do veneno que, no conjunto, não formam poderes sobrenaturais. As práticas mágicas de Medéia nos indicam o domínio e o conhecimento de ervas, infusões e raízes que não denotam possuir poderes mágicos. Este domínio e saber poderiam ser encontrados em algumas mulheres que circulavam em Atenas, sendo comum entre as mulheres atenienses e estrangeiras que necessitavam do uso de plantas e ervas para fins terapêuticos.
Medéia representava a mulher estrangeira que detinha esta habilidade e o conhecimento de sua função e eficácia. A documentação textual nos indica várias mulheres míticas que detinham o conhecimento e o domínio de ervas e filtros para encantamentos como Helena e Circe. Este saber, que se estendeu por tradição às mulheres, consistia na habilidade em manejar o cozimento das ervas, folhas e raízes para fazer infusões e filtros, que, devido ao seu poder de cura, passaram a ser considerados mágicos. Acreditamos que a ausência de conhecimento específico do funcionamento da natureza feminina fomentou a necessidade do domínio do uso das ervas pelas mulheres, com o objetivo de atender aos seus problemas de saúde.
O conhecimento das ervas atendia tanto às mulheres casadas quanto às prostitutas e hetairas que necessitavam saber que o efeito de folhas da família das mentas era muito útil para os problemas menstruais; as dores de varizes eram amenizadas com fricção de folhas de hera; a cebola selvagem e o alho triturados com óleo e vinho, tornavam-se eficazes para conter sangramento e secreção vaginal; a erva artemísia atuava sobre o ovário e plantas como a belladona podiam ser usadas como calmante, mas que em porções concentradas tornavam-se abortivas; já as ervas da família do ópium eram eficazes como analgésicos para as mulheres em trabalho de parto.
Temos por suposição que Eurípides expõe na habilidade de Medéia, que esta habilidade era um saber prejudicial à comunidade masculina. O seu desagravo seria a extensão do temor dos homens de Atenas pela participação ativa das mulheres junto ao uso das ervas e ungüentos considerados mágicos. A preocupação do poeta com o uso das raízes pode estar direcionada às ervas específicas que visavam despertar o interesse sexual. Um episódio desta natureza pode ser observado na citação da Ilíada (XIV, 198) quando uma mulher solicita à deusa Afrodite que a encante com o desejo e o feitiço do amor para que ela possa usar deste ardil com o seu amado. Acreditamos que esta mulher tenha sido aconselhada a usar as folhas de orquídias trituradas com vinho, um eficaz medicamento contra a impotência masculina - o termo orchis significa testículo em grego - e, no caso das porções/kukeon e filtros mágicos, ao serem ingeridos pelo ser amado, podiam ter como resultado a sua morte.
As ervas consideradas mágicas usadas pelas mulheres em forma de banhos e ungüentos, permaneciam em seu corpo em meio a fragrâncias aromáticas, mas havia a possibilidade de causar problemas na virilidade masculina, quando se tratava de ungüentos contraceptivos que podiam fomentar a impotência masculina. Havia plantas, ervas e raízes que também eram conhecidas por suas virtudes apotropaicas e usadas como amuleto contra a má sorte e roubos. Umas faziam prosperar os negócios outras eram eficazes para arruinar a saúde e as atividades do inimigo.
Concluímos que o poeta utiliza o espaço do teatro de Atenas, através da personagem Medéia, para fazer uma denúncia, alertando para a emergência de antigos saberes integrando novas práticas sociais como o uso do conhecimento mágico das ervas e filtros para atender desejos individuais. O uso das práticas mágicas das ervas e raízes tanto podia atender às necessidades de medicamentos para curar as doenças femininas, quanto ser usado como veneno para efetuar uma vingança. Medéia com a sua sophia expõe a ambigüidade de um saber que poderia ajudar um amigo com os seus benefícios, mas poderia ser fatal e destruir os inimigos. Como nos afirma Medéia, temido será sempre quem possui este saber, pois aquele que provocou este ódio não celebrará facilmente a bela vitória.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

VISÃO DE UM PROMOTOR DE JUSTIÇA SOBRE JUSTIÇA E VINGANÇA

Entrevista com o Promotor de Justiça Marcos Pereira Anjo Coutinho, realizada no dia 07 maio de 2010.

01 – O que diferencia justiça de vingança no âmbito do Direito Penal e na sociedade?
“Na evolução do Direito Penal, justiça e vingança já representaram um mesmo valor. Ou seja, durante séculos, a sanção por infração à Lei ou aos costumes nada mais era do que uma vingança, com fundamento privado (Lei de Talião), divino ou público. Apenas com o Iluminismo, em meados do século XVIII, é que se tem o embrião do Direito Penal moderno, em que a justiça tem uma ideia ou noção distinta da vingança. Justiça, dentre as diversas acepções filosóficas ou jurídicas seria um fator de prevenção ou inibição, de correção, de reparação da ordem violada ou, por exemplo, de extirpação do fator responsável pelo delito e ressocialização. Entretanto, ainda hoje, enorme número de pessoas busca uma vingança através do Direito Penal. Basta uma simples leitura nos "comentários dos leitores" de jornais na internet para detectarmos "filosofias" ou "paradigmas" anteriores mesmo ao "olho por olho, dente por dente"”.

02 – A ideia de punição em Direito Penal não implicaria em uma forma de fazer vingança? Afinal, apesar do caráter ressocializador e de prevenção social da pena, podemos perceber que as penitenciárias não recuperam os apenados, mas sim formam criminosos em potencial, o que é comprovado pelo elevado índice de reincidência.
“Depende. Se a ideia é punir a infração à Lei, com paradigmas pós Marques de Beccaria, pode-se afirmar que não. Entretanto, se a ideia de punição reside na vontade de impingir ao criminoso um sofrimento pelo prática do fato proibido, pode-se concluir como vingança. Formalmente, em nosso sistema penal, a vingança está descartada. Na prática nua e crua, todavia, pela falência da Administração Pública especialmente, a pena privativa de liberdade é uma vingança ou, no mínimo, um mal intenso. E os políticos não se preocupam porque o paradigma médio vigente na sociedade está ainda séculos atrás de Beccaria.”

03 – Antigamente o homem pautava-se pela Lei de Talião, “olho por olho, dente por dente”, ou seja, o mal era pago com um mal proporcional. Vê-se que, sob esse ponto de vista, vingança coincidiria com justiça desde que ministrada proporcionalmente à medida da ofensa vingada. Hoje, como podemos perceber na nossa realidade social, a essência é a mesma, continua-se pagando o mal com outro mal, o que mudou foi a denominação para este ato. Antes se fazia vingança e hoje se faz justiça. Portanto, podemos inferir que talvez justiça seja uma palavra mais “civilizada” para designar vingança. O que o senhor pensa a este respeito?
“Na verdade, desculpando-me pelo trocadilho, mas, "que se faça um pouco de justiça ao olho por olho, dente por dente", pois a Lei de Talião, há milênios, foi um grande avanço no que podemos chamar de Direito Penal primitivo. Foi quase tão avançado como hoje em dia é o 'solidarismo constitucional' ou a "normatividade dos princípios". Ou seja, numa sociedade que era menos do que uma caricatura do que conhecemos hoje como organização social, a Lei de Talião representava um freio ou uma rédea na exacerbada vingança privada. Foi um limite. Sob esse ângulo, não seria ousado afirmar que era uma manifestação de justiça? Hoje, exemplificamos a lei de talião como vingança e injustiça. No gérmen de sua criação, entretanto, havia uma semente de justiça. Curioso e paradoxal, não? As afirmações, nesse sentido, devem ser feitas com cautela.
Há uma evolução normativa e principiológica real, atualmente. Mas pena, sanção e Direito Penal não são questões de uma área estanque ou isolada. A Lei tem que sair do papel e é nesse ponto, pela ineficiência estatal e paradigmas filosóficos vigentes na sociedade que, muitas vezes, confundem-se novamente as ideias de justiça e vingança. Mas, não se mostra correto, afirmar-se, taxativamente, que justiça seja uma palavra mais civilizada para designar vingança”.

04 – O que torna a justiça mais justa e a vingança menos justa?
“A vingança sempre é menos justa. Lado outro, a justiça criminal mais justa, na minha opinião, é a que melhor se amolda ao princípio da solidariedade (quase um "amar ao próximo como a si mesmo"), que reconhece na sociedade um elo indissolúvel entre os homens. Se um filho seu fosse condenado, o que você iria preferir? Pena restritiva de direitos, trabalho, educação ou prisão e encarceramento? Não há efetivamente uma justiça criminal nessa distinção? É por aí que evolui do direito penal mais justo, calcado na certeza de que a prisão é um mal necessário e que deve ser restringido o máximo possível, para a integração e ressocialização.”

05 – Quando pensamos em vingança, nos vem logo à mente o ato de “fazer justiça com as próprias mãos”, e quando pensamos em justiça, temos a impressão de que é algo legalizado, porque é realizado pelo Estado. Mas exercer a justiça através do Estado a torna justa? Não seria um meio de exercer a vingança de forma legalizada?
“Na minha opinião, não. Evidentemente, que a resposta é não, desde que a justiça criminal estatal seja calcada nos paradigmas pós Iluminismo.”

06 – O que há de comum entre justiça e vingança?
“Já se confundiram no início da história do direito penal. E nossa sociedade, ainda muito barbarizada, não aceita a imposição jurídica detentora de paradigmas distanciados de sua realidade fática.”
07 – Na sociedade, há a compreensão de que um homem que faz justiça não suja as mãos com o sangue do inimigo. Mas o Estado, quando aplica uma pena privativa de liberdade, em cadeias superlotadas, imundas e desprovidas de qualquer qualidade mínima de dignidade, não suja suas mãos com o sangue do inimigo?
“Sim, o Estado nesses casos suja as mãos, sem dúvida. Mas o "poder político" não se incomoda com isso, porque os paradigmas reinantes entre os cidadãos ainda consideram que bandido bom é bandido morto. Logo, não há prejuízos eleitorais. Curiosamente, se formos notar com maiores detalhes, os políticos são muitas vezes os maiores bandidos, mas, contraditoriamente, jantam nas melhores mesas. É a sociedade do TER e não do SER... E a nossa sociedade "justa"”.

08 - O que faz a vingança não ser a justa medida para a aplicação da justiça?
“A vingança, compreendida como um ato de ferir pelo mal praticado, distancia-se dos paradigmas do solidarismo e do garantismo penal.
"Olhe cada caminho com cuidado e atenção. Tente-o quantas vezes julgar necessário. Então, faça apenas a si mesmo uma pergunta: possui esse caminho um coração? Em caso afirmativo, o caminho é bom. Caso contrário, ele não tem a menor importância. Um torna a viagem alegre; enquanto você o seguir, será um com ele. O outro o fará maldizer sua vida. Um o torna forte; o outro o enfraquece". Carlos Castañeda”

domingo, 9 de maio de 2010

O poder das metáforas

Na nossa reflexão sobre justiça e vingança, podemos observar que, na prática, ainda não temos, no Brasil, um conceito sobre esse assunto. Selecionei uma crítica feita por Paulo Queiroz, Doutor em Direito (PUC/SP), Professor Universitário (UniCeub) e Procurador Regional da República em Brasília, a respeito do filme Tropa de Elite, em que a justiça é colocada como algo sujeito a variações de acordo com a nossa vontade. Assim, a justiça é injusta, porque o certo e o errado podem facilmente ser trocados em virtude do nosso próprio ego. Segue abaixo a crítica do Professor Paulo Queiroz:

"A reação de boa parte das pessoas e autoridades aplaudindo a ação do capitão Nascimento (principal personagem do filme "tropa de elite") ao torturar e matar supostos criminosos, parece mostrar claramente que palavras quase sagradas como lei, direito, estado de direito e justiça são apenas metáforas que nada referem concretamente, pois ora servem para legitimar, ora para deslegitimar atos de violência; são enfim palavras carregadas de sentimento cujo sentido e conteúdo são social e arbitrariamente construídos, mesmo porque a rigor não existem fenômenos jurídicos, éticos ou estéticos, mas só uma interpretação jurídica, ética e estética dos fenômenos (Nietzsche).

Com efeito, em nome do direito, da justiça e da ética, é possível tanto proibir quanto autorizar a morte, por exemplo: quando queremos proibir, designamos o ato como injusto, ilegal, criminoso etc; inversamente, se queremos autorizá-la, dizemos que houve legítima defesa, estado de necessidade ou algo parecido. Assim, se um policial inglês confunde um brasileiro com um terrorista e dispara diversas vezes contra ele, matando-o, dirão os ingleses que houve legítima defesa putativa ou similar, e a morte estará assim legitimada; se uma tribo pratica infanticídio de crianças por nascerem com algum tipo de deformidade física ou mental, dirá a Funai que é preciso respeitar a tradição e cultura dos índios; se o Estado decide fundar uma capital no cerrado e destruir o meio ambiente, chamaremos isso de um grande empreendimento em favor do progresso etc.

Mais claramente: se, em nome da liberdade, por exemplo, é proibido o estupro violento, também em nome dela é considerado delito a relação sexual havida com menores (catorze anos, no caso brasileiro) por mais livre o ato e por mais madura a “vítima” em questão. Enfim, a pretexto de afirmar a liberdade sexual, a lei acaba por negá-la, legitimando uma dupla violência: contra a suposta vítima, a quem se nega o direito de decidir por conta própria, e contra seu parceiro, que é rotulado de criminoso, ficando sujeito à pena, de sorte que a lei que proíbe o estupro é a mesma que tem como tal o que não o é.

Até certo ponto compreende-se que assim seja, afinal não existe lei, direito, justiça, liberdade para além do tempo e do espaço; mais: a distinção entre justiça e vingança, entre legalidade e ilegalidade etc. não preexiste à interpretação, mas é dela resultado. O mesmo se poderia dizer também sobre a igualdade etc.: a igualdade que permitiu que brancos escravizassem negros é a mesma que tolera que pardos excluam negros e que estes preferiram a ambos; subjacente a tudo isso estão sempre relações de poder.

E se não tivermos argumentos estritamente técnicos (se é que existem) para justificar a tortura e a execução por grupos policiais, recorreremos a outros rótulos ou metáforas poderosas e então chamaremos suas vítimas de bandidos, criminosos, traficantes, e não só agradeceremos seus atos, como veremos seus algozes como heróis e diremos que seus atos são necessários, justos ou inevitáveis, ao menos enquanto não somos as vítimas dessa violência; o que se passa, conscientemente ou não, é que, quando nos identificamos com os autores da violência, nós os absolvemos ou buscamos de algum modo atenuar-lhes a culpa; quando nos identificamos com as suas vítimas, os condenamos. O direito tem a forma e o tamanho da hipocrisia humana.

Parece certo assim que, no fundo, direito, estado de direito, justiça etc. são apenas metáforas que associamos às sensações que nos causam algum prazer, conforto, segurança ou sentimento análogo; quando as nossas emoções são em sentido oposto, então diremos que se trata de algo injusto ou cruel. A lei é uma espada que tanto pode proteger como ameaçar: tudo depende de quem a manuseia e como o faz, afinal o que faz o poder das palavras e das palavras de ordem, poder de manter a ordem ou de a subverter, é a crença na legitimidade das palavras e daquele que as pronuncia (Pierre Bourdieu. O poder simbólico. Rio: Bertrand Brasil, 1998, p.15).

De todo modo, se entendermos, como querem alguns, que à polícia é dado torturar ou matar, apesar de a lei (de crimes hediondos inclusive), a Constituição em especial, o proibir terminantemente, já não haverá diferença alguma entre policiais e criminosos; e talvez seja mais barato e eficiente simplesmente extinguir as polícias (e com ela todo o aparato repressivo estatal) e contratar mercenários para promoverem tais execuções e torturas e assumir, aberta e oficialmente, que o estado de democrático de direito é apenas uma farsa, uma conveniente e cruel farsa a serviço de uma política , mais ou menos velada, de extermínio dos indesejados."

http://www.investidura.com.br/ufsc/35-direitopenal/642-tropa-de-elite-e-o-poder-das-metaforas.html

sábado, 8 de maio de 2010

ATENTADO TERRORISTA NOS EUA E O CONTRA-ATAQUE: ATO DE JUSTIÇA OU VINGANÇA?

Parecia algo impossível, mas aconteceu... derrubaram o World Trade Center e parte do Pentágono. Ver aviões como bombas aéreas tornou-se real diante dos olhos, o filme “hollywoodiano” saiu das telas e tornou-se história verídica, aliás, em tempos de 3-D, nada mais parece ser impossível de acontecer.

Dúvidas ficaram no ar, estaria o atentado relacionado com o conflito árabe-israelense?
Testemunhar seres humanos abdicar da própria vida, ceifando outras, considerando inimigas pessoas inocentes, tudo na conta do justo, faz-nos pensar o que é a justiça para o ser humano.

A grande surpresa, minha indignação, reside na idéia de que estes homens-bombas são aclamados como heróis, ou seja, um fenômeno social gravíssimo oriundo de um ufanismo egoístico exacerbado do próprio ser humano, motivado por uma justiça pessoal, alienada, enfim... um tanto incompreensível.

Tenho a impressão que a noção de justiça em países como Israel deva ser algo conflitivo e conturbado, principalmente quando eles reagem de forma excessiva, aí, a estratégia adotada remonta a da vingança, do lema “olho por olho, dente por dente”.

Os EUA, prometendo represálias contra os implicados no terrorismo, estão agindo por justiça ou vingança? Não há dúvida de que os culpados devam ser punidos pelos seus atos, mas o combate ao terrorismo precisa ser realizado de modo responsável que não ultrapasse uma resposta que fique estagnada no campo da mera exibição militar, ou seja, de preferência sem guerra.

Neste momento, algo terrível acaba por acontecer: é lícito pensar a justiça como um desejo de vingança, geradora de mais ódio, mais violência e mais terror! É a justiça camuflada pela vingança, que, a meu ver, é o maior retrocesso testemunhado e vivenciado pela humanidade em tempos ditos modernos... modernos como há mil anos atrás!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Direito e coação


“Ao mesmo tempo que define as condutas interindividuais e dispõe sobre modelos de organização, o Direito Positivo apresenta um mecanismo de força, que visa assegurar o cumprimento de suas disposições e a compensar violações irreparáveis de direitos. Os sistemas jurídicos são dotados, assim, de coação, que é a força a serviço da ordem social. […] A força se revela, assim, como instrumento valioso do Direito na busca da estabilidade social. […] Em decorrência da imperfeição humana, que permite a violação dos instrumentos de controle social, é preciso que os sistemas jurídicos aspirem à efetividade e, para tanto, não devem limitar-se à função diretiva, mas desenvolver também a coativa, conforme salienta Arias Bustamante. Não é suficiente, portanto, o teor ético das normas para se obter a observância da lei; é indispensável que o ordenamento jurídico se utilize dos estímulos extras da coação, sanção e garantia jurídica. Para Francesco Carnelutti, recorrer à força é imprescindível ao Direito, pois 'do mesmo modo que para retificar a economia se deve operar economicamente, assim também para dominar as resistências físicas se deve operar fisicamente'. Para o jurista italiano, o que distingue a força adotada pelo Direito da que é usada contra o Direito é o fim para o qual se a emprega.
[…] Pode-se dizer que um elemento é essencial a um objeto quando este, sem aquele, deixa de existir como tal. Para o relógio tradicional, os ponteiros são peças essenciais, de vez que, sem eles, aquele não poderá marcar as horas. Sendo a coação a força física em ato, faz parte da nossa observação o fato de que as normas jurídicas, em sua generalidade, são cumpridas espontaneamente pela sociedade, independentemente do exercício da coação. Isto se torna necessário apenas quando os indivíduos se rebelam, e isto ocorre não como regra geral, mas excepcionalmente. É inaceitável, portanto, que se tome a coação como elemento essencial ao Direito. […] Embora o Direito recorra à força física apenas eventualmente, é fundamental à sua efetividade que ele possa acionar o aparato coativo todas as vezes que se fizer necessário, circunstância esta que por si responde à indagação. O que se nos revela essencial ao Direito é a coercibilidade, ou seja, a possibilidade de o Direito empregar a força. Não houvesse a previsão legal da coação, quais seriam os limites do bad man na sociedade? Que força impediria a sua agressão?
[…] A coação estatal, inclusa nos sistemas jurídicos, é fator valioso e muitas vezes preponderante para se alcançar a obediência à lei. Pelo fato de sua aplicação não ser em caráter permanente, apenas eventual, não faz parte da essência do Direito. A sua previsão nos ordenamentos jurídicos se justifica porque seria contraditório se o legislador, sabedor da fraqueza moral do homem, não dotasse o Direito Positivo de uma reserva de força. O Direito, assim como os demais instrumentos de controle social, seria apenas um convite para a adoção de determinados modelos. A coercibilidade, entendida como possibilidade de o Judiciário ou órgãos da administração acionarem a força, revela-se fator essencial ao Direito”.
Bibliografia: NADER, Paulo. Filosofia do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 59-67.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Entrevista "popular"

Após caracterizar diversos conceitos, entrevistas e comentários para a JUSTIÇA e VINGANÇA, pessoas leigas, que não possuem conhecimento das normas e princípios do direito, depõem de forma livre sobre a sua razão com relação à JUSTIÇA e VINGANÇA. O ordenamento jurídico não entra em questão, percebe-se uma motivação pessoal para compreender o termo, onde o interior é mais expressivo e manifesta-se de forma continua baseado em experiências vividas ou assistidas.
Os critérios utilizados para a entrevista estão listados abaixo:
- máximo de 3 (três) perguntas para cada entrevistado;
- respostas objetivas;
- as informações dos entrevistados é mínima, em respeito à sua privacidade;
- total de 3 (três) entrevistados;
- os entrevistados foram escolhidos por ocasião da oportunidade;
- as perguntas elaboradas é de fácil resposta e não seguem uma ordem cronológica, pois exigem um conhecimento mínimo sem complexidade de acordo com a absorção de cada entrevistado ;
- perguntas:
1. Expresse sua visão/reflexão a respeito da JUSTIÇA?
2. Expresse sua visão/reflexão a respeito da VINGANÇA?
3. Como conciliar JUSTIÇA e/ou VINGANÇA?

Por fim, segue a entrevista:

NILDA, 69 anos, APOSENTADA – Belo Horizonte/MG

1. Expresse sua visão/reflexão a respeito da JUSTIÇA?
Justiça é dar ao seu semelhante o que lhe é de direito. Cabe à Lei e Deus, e não é para ser feita com as próprias mãos. Justiça é ter paciência, nada é resolvido do dia pra noite.

2. Expresse sua visão/reflexão a respeito da VINGANÇA?
Vingança é o ódio subir na sua cabeça e atacar o seu semelhante.

3. Como conciliar JUSTIÇA e/ou VINGANÇA?
Justiça e vingança seriam você esquecer o ódio e entregar na mão divina, pois, não há como conciliar justiça e vingança, se você vinga, a justiça virá, segue atrás, pois atrás de toda vingança tem que ter uma justiça para te punir.


ROSÂNGELA, 49 anos, DONA DE CASA – Belo Horizonte/MG

1. Expresse sua visão /reflexão a respeito da JUSTIÇA?
Justiça é pagar aquilo que devemos. É fazer valer meus direitos.

2. Expresse sua visão/reflexão a respeito da VINGANÇA?
Vingança é pagar pelo mau, retornar o mau.

3. Como conciliar JUSTIÇA e/ou VINGANÇA?
Justiça e vingança, ambas não andam juntas, depende do ponto de vista, ou você quer o direito ou você quer vingar, e ambas não andam juntas.


CAROLINA, 18 anos, ESTUDANTE – Belo Horizonte/MG

1. Expresse sua visão /reflexão a respeito da JUSTIÇA?
Justiça é querer meus direitos, querer tudo certo, como se fosse um conforto que adquirimos em determinadas situações.

2. Expresse sua visão/reflexão a respeito da VINGANÇA?
Vingança é brigar pelo que te fez mal, é descontar toda a sua raiva e angustia. É não saber exercer um controle. É não ter paciência e usar as próprias “mãos” para fazer o que acha correto.

3. Como conciliar JUSTIÇA e/ou VINGANÇA?
Justiça e vingança é saber reformar, não é correto ter os dois lado a lado. É necessário após de uma vingança que haja justiça.


Conclui-se que o termo JUSTIÇA e VINGANÇA são de extrema complexidade, uma vez que as pessoas utilizam de sentimentos, estes às vezes aflorados (feridos) ou não, para distinguir ou absorver (JUSTIÇA e VINGANÇA) como um só, em reflexão de sua vida ou da sociedade.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Um ponto de vista constitucional acerca da justiça e da vingança

Ao pensar em justiça e vingança, o que vem primeiro à minha mente é, justamente, a ideia de direito penal. Todavia, pensar que vingança e justiça se vinculam necessariamente apenas a este ramo jurídico específico é, sem dúvida, um erro. Foi pensando nisso que resolvi buscar um ponto de vista constitucional acerca deste tema, tendo em vista a Constituição Federal brasileira. Para tanto, conversei com o professor de Direito Constitucional Fernando Horta, que leciona no campus da Praça da Liberdade da PUC, e que gentilmente comentou brevemente sobre o assunto.

“A ideia de justiça está presente no preâmbulo da Constituição Federal brasileira, que diz:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.

O preâmbulo prevê que nós devemos construir uma sociedade justa e solidária. Este que é, inclusive, um dos objetivos do próprio país. A República Federativa do Brasil se fundamenta, também, na ideia de não discriminação, na ideia de solidariedade e, sobretudo na ideia de justiça social. Então, o que se pretende com a Constituição é, exatamente, evitar que tenhamos brasileiros em situações de desigualdade. Sendo assim, a justiça perpassa, sobretudo pela chamada justiça social. Os constitucionalistas, século XVIII e XIX, e as constituições do pós-guerra procuraram evitar a ideia de vingança. Vingança que já havia sido proibida até mesmo em Roma! A vingança passou a não ser mais tolerada e foi substituída pelas cláusulas do devido processo legal. A Constituição brasileira, por exemplo, diz, no artigo 5º que ninguém perderá sua liberdade ou o seu patrimônio sem o devido processo legal (“artigo 5º, inciso LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”). Então, quando se fere alguém, resultando em morte, lesão corporal, etc., a resposta da sociedade se faz pela aplicação desta cláusula do devido processo, que não significa vingança, significa que a sociedade reage contra o mal. Por isso que a vingança foi mesmo sepultada e em seu lugar foi implantada a democracia do processo.”

Disto concluo que a Constituição pátria assegura à sociedade brasileira o devido processo legal, este que permite que algo seja feito frente às injustiças que porventura o povo brasileiro venha a sofrer. Sendo assim, à luz dos ditames constitucionais, não há mais que se falar em vingança, mas sim em uma justiça alcançada e possibilitada a partir do devido processo legal.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Justiça e Vingança frente a Exploração do Trabalho Infantil

Inicialmente é importante tratarmos de um problema que se torna cada vez mais difícil de controlar que é a exploração do trabalho infantil. Este é o trabalho exercido por crianças e adolescentes que trabalham por vontade ou por obrigação, e que tenha idade abaixo da mínima legal permitida para exercer funções de trabalho, sendo mais de 5 milhões de jovens entre 5 e 17 anos de idade vítimas de exploração no Brasil.
Essa exploração do trabalho ou mão de obra de crianças e adolescentes torna mais comum em regiões mais pobres que não possuem recursos e uma maior fiscalização, em que elas acabam sujeitas a este tipo de trabalho, devido a grande necessidade financeira que sua familia sobrevive.
A princípio podemos dizer que é proibido por lei, sendo em alguns casos especiais, que existem formas mais nocivas, agressivas ou cruéis de como exploram o trabalho infantil, tais atitudes não apenas são proibidas por leis, mas também se constituem como crime, como exemplo, o trabalho infantil escravo, maus-tratos, exploração da prostituição de menores. A legislação brasileira proíbe qualquer tipo de trabalho para menores de 14 anos, sendo permitido a partir dos 14 anos apenas na condição de aprendiz, em atividades relacionada à qualificação profissional. E acima dos 16 anos o trabalho é autorizado desde que não atrapalhe a jornada escolar. Contudo, se o jovem com mais de 16 anos não tiver carteira assinada ou estiver em situação precária, ele entra nos números de trabalho infantil ilegal e ilegal.
No entanto, apesar de existir leis que possam proibir oficialmente este tipo de trabalho, sabemos que é comum nas grandes cidades do Brasil esse tipo de trabalho, em que há presença de menores de idade em cruzamentos de avenidas movimentadas, vendendo objetos, entre outros que tenham pequeno valor monetário. Outra forma de exploração seriam aqueles menores que trabalham em carvoarias que ficam sujeitas aos riscos de queimaduras, à desnutrição, doenças respiratórias decorrentes da liberação de gases durante a queima do carvão, tuberculose, tétano, doença de chagas, resfriados, conjutivite, dores musculares, problemas de coluna e envenenamento por picada de cobras e insetos. E ainda, existem aquelas que são submetidas à exploração sexual comercial, que trocam seus corpos por um prato de comida, ou mesmo para ajudar sua família.
Nesse contexto, observa-se que as desigualdades sociais refletem o sofrimento dessas crianças, falta de oportunidades, ausência de incentivo que rouba sua infância e a priva de seu pleno desenvolvimento, que lhe dá responsabilidade substituindo o adulto, impedindo de brincar e frequentar normalmente a escola, fazendo com que ela pule fases importantes da vida, algo que trará danos irreparáveis à pessoa humana e virá à tona em algum momento da vida adulta.
Por isto, cabe salientar que são diversas as causas do trabalho infantil e as relações entre educação e trabalho precoce também não são triviais. Sendo necessário ações do Estado e da sociedade frente à questão que exige mobilização da energia social, além de um sentimento vingativo contra aqueles que favorecem a exploração do menor, bem como, também é necessário a criação de mecanismo eficazes para sua aplicação, além da elaboração e do desenvolvimento de programas eficientes de combate a esse fenômeno socialmente indesejável. As instituições, os instrumentos e os programas para combater o trabalho infantil no Brasil têm demonstrado grandes esforços para vencer o desafio imposto pelo problema, como a criação de órgãos, implantando programas de geração de renda para as famílias, jornadas escolar ampliada e bolsas para estudantes, tentando dar possibilidade a esse grupo vulnerável a melhores condições.
Entretanto, apesar das leis e programas existentes para combater o trabalho infantil, muita coisa errada ainda persiste em nosso país, sendo nesse caso, necessário a concientização do poder público e a sociedade em seu conjunto, no que se refere ao problema do trabalho infantil, para que deixem de buscar o interesse próprio e passem a contemplar toda e qualquer criança como ser humano com plena aptidão para sentir, aprender, reagir, amar, dialogar, tornando-se titular do incondicional direito de ter oportunidades reais para ser capaz de autodeterminar -se livre e dignamente no âmbito de sua secular e peculiar existência.

domingo, 2 de maio de 2010

Vigiar e Punir X Justiça e Vingança

Em sua obra, Vigiar e Punir, Foucault estuda o desenvolvimento da sociedade disciplinar, a partir dos séc. XVII e XVIII, abordando um grande problema social que é a criminalidade controlando o sistema judiciário coercitivo. Assim, Foucault estabelece um raciocínio histórico entre a realidade social e a evoluçäo do direito de punir.
De acordo com os estudiosos da área, para que o sistema funcione, é necessário que haja uma remoçäo no paralelo existente entre o detentor do poder e o condenado, ou seja, havendo tal remoçäo, a justiça poderá agir, substituíndo a vingança pela real puniçäo.
Foucault trabalha a idéia da ressocializaçäo do indivíduo, onde este deve ficar recluso do resto da sociedade afim de modificar a sua situaçaäo marginal, contribuíndo para a sua recolocaçäo dentro da sociedade.
Sendo assim, quando o Governo (detentor da justiça) molda seus cidadãos, na verdade, está formando ferramentas para a eficácia da sua administração. Dessa forma, tal como na Idade Média foi inventado o inquérito, que era a técnica de busca da verdade para a aplicação da justiça que se opunha ao julgamento de Deus, no séc. XVIII, foi inventado a técnica da disciplina e o exame, onde esta consiste em um processo que invade a problematizaçäo do criminoso por de traz do seu crime.
Neste contexto, tinha-se a prisão como uma peça fundamental para a aplicação da punição. Porém, a muito tempo já se percebeu que as prisões não diminuíram a criminalidade, e sim, a pioraram, devolvendo a sociedade indivíduos mais vingativos do que aqueles tão sonhados ressocializados.
Portanto, Foucault conclui que a justiça penal tende, dentro da prisão, a transformar o processo punitivo em técnica carcerária, tornando o ato punitivo em prática natural e legítima, sendo uma medida dinâmica ao processo punitivo-vingativo e a adequação dos meios e poderes políticos sobre a função corretiva.

sábado, 1 de maio de 2010

A justiça é injusta?

Podemos afirmar que os julgadores, sejam juízes, desembargadores, ministros, absolutamente não são os senhores da verdade. Apenas possuem o poder de julgar, baseado na lei, em suas convicções e em provas. Afinal, a própria Constituição possui várias brechas para favorecer os injustos. Vários cidadãos possuem o poder de persuadir e assim criar um falso convencimento. Nesse mundo capitalista, o dinheiro faz miséria aos menos afortunados. Quem tem poder, seja ele qual for, faz a justiça vingar a seu modo. Depender da "justiça" é uma faca de dois gumes.
Proponho uma reflexão a respeito das delicadas fronteiras entre a Justiça e a Vingança, que podem até ser coisas parecidas, mas não são. Em momentos que mexem com nossas emoções, devemos fazer um esforço pra não confundir justiça com vingança, pois a justiça é um valor universal, estando ao lado de outros valores tais como a liberdade, solidariedade, a dignidade, a democracia… Esses são valores sob os quais está edificado a civilização em que vivemos. Nossa compreensão pode até se embaralhar, mas a vingança se esgota facilmente e nunca é saciada plenamente.
O ser humano vingativo sente apenas um prazer momentâneo que logo desaparece após o “acerto de contas”, dando lugar a destruição, ao vazio existencial, e muitas vezes ao sentimento de culpa e remorso pela dor causada intencionalmente no outro.
Portanto, deve-se ter cautela ao analisar tais termos, buscando sempre uma resposta para saber se a justiça é realmente justa ainda mais em confronto com a vingança.